A conta é complicada, mas a parte que banca William, Kate e Harry vem de propriedades particulares do príncipe Charles
Quanto custa dar uma
vida de rainha a uma rainha? E quanto vai custar para manter a futura mulher do
príncipe Harry, Meghan Markle?
São contas separadas e
complicadas, além de estritamente vigiadas. A complicação vem de custos
sigilosos, como o da segurança, e dos arranjos feitos para as particularidades
únicas da monarquia britânica.
Em que outro lugar
existiria na segunda década do terceiro milênio algo como o trem real? Como
berço da primeira máquina a vapor, um aperfeiçoamento do escocês James Watt, o
Reino Unido tem também um trem usado só por três pessoas: Elizabeth II; o
marido dela, Philip, e o filho e herdeiro, Charles.
Sai caro, mas a
rainha, que tem hábitos pessoais frugais, o adora. A era dos cortes
orçamentários já levou, em 1997, outro meio de transporte de estimação, o iate
Britannia. Com 91 anos e todo tipo de recorde de longevidade de reinado e até
de casamento, Elizabeth conseguiu uma sobrevida para o trem.
Uma única e curta
viagem nele feita pelo príncipe Philip custou 46 083 libras (todos as quantias
são multiplicadas por 4,3 para ter o equivalente em reais). O dado foi
ressaltado pelo Guardian, o mais conhecido jornal britânico de esquerda e, como
tal, antimonarquista.
Devido ao enorme
respeito nacional pela figura da rainha, o jornal controla os impulsos
críticos. Mas não dá folga, como é desejável nas democracias. É dele a
informação de que a rainha terá um “aumento” de verbas públicas ao longo dos
próximos dez anos.
Com isso, receberá até
82 milhões de libras para bancar os custos diretos da monarquia. O aumento foi
aprovado levando em consideração gastos considerados obrigatórios, como os 370
milhões de libras destinados a obras de reforma e modernização do Palácio de
Buckingham, que ainda tem banheiros com fossa.
EM FAMÍLIA Mas de quem é o
palácio, da rainha ou da nação? As duas coisas – esta é outra das
complicações.
O palácio, como muitas
outros monumentos nacionais, é de propriedade da Coroa e administrado por uma
entidade independente. Uma porcentagem da receita obtida com palácios, parques,
propriedades rurais e urbanas, incluindo imóveis em lugares valorizadíssimos de
Londres, num total estonteante de 12 bilhões de libras, vai para a verba real,
chamada em inglês de Sovereign Fund.
Esta participação era
de 15% e passará para 25% — daí o aumento. As propriedades da Coroa foram
passadas para o Estado em 1760 por George III, o rei que perdeu o juízo e a
América.
Além das verbas
públicas, a realeza também gasta dinheiro do próprio bolso, por assim dizer. O
dinheiro vem de duas grandes holdings familiares, os ducados reais, recebidos
em herança pessoal.
A rainha tem o ducado
de Lancaster, ou Lancastre, a dinastia real mais conhecida atualmente por ter
inspirado os Lannister de Game of Thrones. O primeiro monarca a ser duque de
Lancaster, título herdado via casamento do pai, foi Henrique IV (1367-1413).
As encrencas genealógicas,
dinásticas, militares e políticas da época aparecem na tetralogia histórica de
Shakespeare com os nomes dos últimos reis da linhagem, encerrada com Ricardo
III, o rei corcunda que reinou apenas dois anos antes de ser morto na batalha
de Bosworth (“Consciência é uma palavra usada pelos covardes para incutir
medo aos fortes”, diz na peça o inspirador de Tyrion Lannister, o anão de Game
of Thrones).
BOLSO DO SOGRO Como filho mais velho,
o príncipe Charles herdou o ducado da Cornualha, outra espécie de holding
produtiva e lucrativa, incluindo uma grande propriedade rural no sul da
Inglaterra onde o futuro rei implantou a agricultura sustentável. Último
faturamento anual: 22,5 milhões de libras.
É esse dinheiro que
sustenta os filhos, William e Harry, que não trabalham mais, exceto como
membros da realeza “em tempo integral”.
Cada vez que Kate
aparece com um vestido novo, também é do bolso do sogro que sai a despesa,
apesar das queixas de que reclamam de mais uma facada nos contribuintes.
Segundo o cálculo mais
recentes, o último total anual com os filhos, a nora e os dois netos foi de 3,2
milhões de libras. Charles também deve assumir os gastos de Meghan Markle, a
noiva de Harry.
No papel, Meghan vai
ter uma redução de renda. Segundo um site especializado, ela ganhava 50 mil
dólares por episódio da série Suits, além de patrocínios. Como vai ser uma
Alteza Real, provavelmente com título de duquesa, não poderá faturar com a
posto nem ganhar roupas e mimos em geral, como fazem outros membros da família.
É claro que vai
desfrutar de uma vida única, começando a vida de casada no “chalé” do Palácio
de Kensington onde Harry mora.
Esta é uma recompensa
intangível ou impossível de calcular. Da mesma forma que os benefícios, em
termos de imagem, ou branding ou soft power, no caso de países, que a realeza
traz.
Sem contar o papel
mais direto que seus membros desempenham para promover negócios. Num balé
diplomático perfeitamente calibrado, em grandes contratos, especialmente em
países que são ex-colônias e continuam deslumbrados com a realeza, uma visita
coroada pode ser a cláusula não escrita.
Quando uma notícia
boa, geradora de sentimentos positivos, como o casamento de Harry e Meghan, a
mídia espontânea assume proporções avassaladoras. Provavelmente só na Coreia do
Norte não saiu uma foto do casal apaixonado.
A um custo total
calculado em mais de 340 milhões de libras por ano, não sai barato. Muitos
primos da rainha ainda desfrutam de benesses que, no futuro, serão limitadas ao
rei e seus filhos e cônjuges.
Os integrantes da
família real, como é seu dever fundamental, se reproduzem. William e Kate,
criticados como folgados em suas funções oficiais — visitar, inaugurar,
promover, cumprimentar e, nos últimos anos, posar para selfies —, estão a
caminho do terceiro.
Meghan e Harry
certamente vão correr atrás. Quem vai resistir a dar a foto do futuro bebê,
neto de Diana e de uma instrutora de ioga americana negra, um símbolo poderoso
da evolução da raça humana?
Postado originalmente no
Veja.Abril
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