08 maio 2018

Saiba o que é Crime de Concussão


O crime de concussão está descrito no artigo 316 do Código Penal e consiste em um agente público exigir vantagem indevida, para si ou para outrem (outra pessoa), de forma direta ou indireta, mesmo fora da função pública ou até antes de assumi-la, mas desde que o faça em razão da função.

Esse delito está previsto na parte inicial do artigo 316, conhecida como caput (significa “cabeça”, em latim), que contém a norma central de cada artigo nas leis. O mesmo artigo descreve outro crime semelhante, denominado “excesso de exação”, em seu § 1.º [O simbolo § lê-se como “parágrafo”. Para saber mais sobre a estrutura das normas jurídicas, veja o texto Artigos, parágrafos, incisos e alíneas: como se elaboram as leis, aqui no blog.]

A pena fixada no Código Penal para esse crime, no Brasil, é de dois a oito anos de reclusão, mais multa.

O Código Penal define-o como crime contra a administração pública. Esta é a “vítima” desse delito, pois o agente público que o comete fere os princípios éticos e jurídicos que devem orientar toda ação do poder público. A concussão afeta também a liberdade individual da pessoa contra a qual é feita a exigência indevida pelo funcionário público e geralmente atinge o patrimônio dela, mas esses aspectos são considerados secundários pelo Código Penal, apesar de relevantes.

Quem pode praticar concussão (sujeito ativo do crime)
Concussão é crime de funcionário público, pois o Código Penal brasileiro o inseriu no capítulo que trata dos crimes contra a administração pública praticados por funcionário público. Só agente público pode praticá-lo. É o que se chama crime próprio, pois só uma categoria específica de pessoas pode cometê-lo.

O artigo 327 do Código Penal define quem é considerado funcionário público, para aplicação das leis criminais. O conceito é amplo e abrange:

a) qualquer pessoa que, mesmo de forma transitória (temporária) ou sem remuneração, ocupe cargo ou emprego público ou exerça função pública;

b) pessoas que atuem em entidade paraestatal (autarquias, sociedades de economia mista, empresas públicas, fundações públicas) ou que trabalhem para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para execução de atividade pública.

Pode ocorrer de o agente público se associar a outros ou a um particular para fazer a exigência indevida. Nesse caso, todos responderão pelo delito, na medida de sua culpabilidade.

Elementos do crime
No crime de concussão, os elementos da conduta são os seguintes: a) exigência de vantagem indevida; b) destinação da vantagem indevida para o funcionário público ou para terceira pessoa; c) imposição da exigência indevida sobre a vontade da pessoa de quem é exigida.

A exigência indevida deve ter relação com a função pública. Se um agente público fizer exigência indevida, mesmo que por meio de violência ou ameaça, mas sem relação com a função pública, poderá cometer outra espécie de crime, como o próprio crime de ameaça ou constrangimento ilegal, extorsão ou roubo, por exemplo, conforme o caso.

O agente da concussão somente pode praticar o crime devido à função pública, mas não precisa estar no efetivo exercício dela. Pode estar em férias ou em licença, por exemplo.

É a exigência, a imposição, feita pelo agente público à vítima que caracteriza a concussão. A exigência deve ser capaz de gerar algum temor ou receio na vítima e, desse modo, dobra a vontade desta. Não é preciso que o agente público cause mal concreto à vítima, basta que faça a exigência indevida e imponha sua vontade.

A exigência pode ser feita de forma direta, ou seja, pelo próprio agente público e de maneira explícita, aberta, ou indireta, isto é, por terceira pessoa ou de maneira implícita, dissimulada.

É preciso que o agente efetivamente exija a vantagem, não basta que a peça, que a solicite. Quando servidor público apenas pede vantagem ilícita devido à sua função, isso caracteriza outro crime, o de corrupção passiva, previsto no artigo 317 do Código Penal.

Se a vantagem for oferecida por alguém ao agente público, não haverá crime de concussão, mas corrupção ativa, de acordo com o artigo 333 do Código Penal.

Se a vantagem não for destinada ao próprio servidor público ou a pessoa indicada por ele, mas para o próprio órgão ou ente público, também não ocorrerá concussão, mas outro crime, denominado excesso de exação, previsto no artigo 316, § 1.º, do Código Penal, como se disse.

A vantagem exigida pelo agente público precisa ser indevida, isto é, injusta, ilegal. Pode ser presente ou futura, ou seja, o agente pode pedir algo para receber imediatamente ou em outro momento.

A concussão tem natureza de crime formal. Isso significa que o crime se consuma apenas pela conduta da pessoa, independentemente de produzir resultado. Portanto, não é preciso que o agente público obtenha a vantagem ilícita que exigiu, pois, com a simples exigência dela, já terá cometido o delito. Se o autor da concussão vier de fato a receber a vantagem indevida, isso é o que se chama de exaurimento do crime, no Direito Penal, mas não é indispensável para consumação da concussão.

A vantagem indevida pode ser de qualquer espécie, não só de caráter econômico (patrimonial). O Código Penal não faz essa exigência para caracterização do crime, ao contrário do que ocorre em relação com os chamados crimes contra o patrimônio, como o roubo, o furto e o estelionato, entre outros.

Não ocorre concussão se o agente público, em vez de exigir a vantagem, propõe ao particular (pessoa física ou jurídica) a realização de negócio ilegal, para que ambos tenham vantagem. Essa é uma das situações em que o agente público e o particular, ambos desonestos, se associam para subtrair dinheiro ou outra vantagem da administração pública e com isso enriquecerem.

Nesses casos, como não houve exigência (imposição) por parte do agente público, mas uma negociata entre ele e o particular, não haverá concussão, mas poderá haver outros crimes, como o de peculato (apropriação ou desvio de bens públicos), fraude a licitação, corrupção etc., a depender das circunstâncias.

Excesso de exação
Excesso de exação é uma forma especial de concussão, prevista no § 1.º do artigo 316 do Código Penal. Significa excesso de cobrança ao contribuinte de valores de um tributo qualquer.

Ocorre excesso de exação quando o funcionário público:

a) exige tributo que sabe ou deveria saber que é indevido;

b) ou, mesmo quando o tributo seja devido, utiliza na cobrança meio vexatório (constrangedor, humilhante, vergonhoso) ou gravoso (excessivo), que a lei não autoriza.

A pena para essa conduta é de reclusão, de três a oito anos, mais multa.

Diferencia o excesso de exação da concussão o fato de que a vantagem exigida pelo agente público não é destinada a si mesmo, mas ao órgão ou ente público. Além disso, a exigência deve referir-se à cobrança de tributo.

O § 2.º do mesmo artigo 316 define ainda uma forma mais grave do crime de excesso de exação. Ela ocorre quando o funcionário público desvia, em proveito próprio ou de outra pessoa, o que recebeu indevidamente para recolher aos cofres públicos. Nesse caso, a pena é de dois a doze anos de reclusão, mais multa.

Aumento de pena
O § 2.º do artigo 327 do Código Penal estabelece que são aumentadas de um terço as penas dos crimes contra a administração pública praticados por ocupantes de cargos em comissão ou exercentes de função de direção ou assessoramento dos órgãos e entidades públicos.

Justifica-se o aumento pelo fato de que essas pessoas têm maior grau de responsabilidade e são remuneradas a mais por isso. Se praticam crime, o grau de reprovação de sua conduta (reprovabilidade) é maior, motivo pelo qual merecem punição mais severa.

Concussão na administração tributária
A Lei 8.137, de 27 de dezembro de 1990, que define crimes contra a ordem tributária, previu forma específica de concussão para agentes públicos que trabalhem em órgãos ligados à administração tributária.

Seu artigo 3.º, inciso II, define como crime as seguintes condutas: “exigir, solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de iniciar seu exercício, mas em razão dela, vantagem indevida; ou aceitar promessa de tal vantagem, para deixar de lançar ou cobrar tributo ou contribuição social, ou cobrá-los parcialmente”.

A pena, nesses casos, é de reclusão, de três a oito anos, e multa – mais elevada do que a concussão do Código Penal, portanto.

Qualquer das condutas mencionadas nesse artigo (exigir, solicitar ou receber) caracteriza o crime. A equivalente à concussão do artigo 316 do Código Penal é a de exigir vantagem indevida.

Como se trata de norma especial para servidores públicos da administração tributária, é ela que se aplica à concussão quando praticada por eles, devido ao chamado princípio da especialidade.

Ato de improbidade
Em geral, os crimes contra a administração pública praticados por funcionário público também são punidos como atos de improbidade administrativa, por uma lei especial, a Lei 8.429, de 2 de junho de 1992, conhecida como Lei da Improbidade Administrativa.

Ato de improbidade, legalmente, não é crime, mas outra espécie de ato ilícito. Para entender mais sobre as semelhanças e diferenças, veja o texto Crimes e atos de improbidade, no blog.

Ação penal
Os crimes contra a administração pública geram ação penal de iniciativa pública (também chamada de ação penal pública), ou seja, que cabe ao Ministério Público. Para saber mais, veja o texto Ação penal pública e privada, aqui no blog.

A investigação, em geral, cabe à polícia, por meio de inquérito. Em alguns casos, o ato de concussão dá origem a sindicância ou processo administrativo disciplinar, e todas as circunstâncias são esclarecidas dessa forma pelo próprio órgão ou ente público. Nessa situação, o Ministério Público pode promover a ação penal diretamente, sem necessidade de inquérito.

Se a concussão for praticada por funcionário público federal, a apuração competirá à Polícia Federal, e o processo, ao Ministério Público Federal. A ação será julgada pela Justiça Federal. Se o autor for funcionário público estadual ou municipal, a apuração será feita pela Polícia Civil; o processo criminal será ajuizado pelo Ministério Público estadual e julgado pela Justiça Estadual.


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