Ex-chanceler Celso Amorim participará do Seminário em Defesa da Soberania
Nacional e Popular, em Brasília (DF), na próxima semana
Queimadas na Amazônia levaram governo
Bolsonaro a assumir
retórica supostamente nacionalista / Foto: L.
Parmitano/ESA/NASA
Para o
ex-chanceler brasileiro Celso Amorim (2003-2011), a tensão diplomática entre o
governo de Jair Bolsonaro (PSL) e o do francês Emmanuel Macron em torno
das queimadas na Amazônia é mais um indicativo da guinada imposta ao Itamaraty.
Ao Brasil de Fato,
Amorim afirma que o caso revela duas concepções de soberania, uma que
representa interesses nacionais e outra a serviço de nações imperialistas.
“A nossa concepção de soberania é defesa dos recursos naturais,
da nossa capacidade de desenvolvimento autônomo, uma política externa que
sempre busque o interesse nacional, explorando inclusive a
multipolaridade; ao invés de ser um país totalmente alinhado a uma
potência, qualquer que ela seja”, analisa.
Como parte da discussão e ação sobre o tema, Amorim participará
do Seminário em Defesa da Soberania Nacional e Popular, atividade organizada
pelas frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo. O evento será no próximo dia 4 de
setembro, em Brasília (DF), e já conta com as confirmações da
ex-presidenta Dilma Rousseff, o ex-senador Roberto Requião, os
ex-candidatos à Presidência Fernando Haddad e Guilherme Boulos; além
de Makota Celinha, do Centro Nacional de Africanidade e Resistência
Afro-Brasileira, e de Anita Wright, do Conselho Nacional de Igrejas
Cristãs do Brasil, entre outros.
Segundo o diplomata aposentado, Bolsonaro e o ministro das
Relações Exteriores do Brasil, Ernesto Araújo, replicam no nível internacional
sua concepção doméstica, a de que “dentro da minha casa eu posso tudo, e na rua
eu posso andar armado”.
“A concepção deles de soberania é uma imitação da de [Donald]
Trump, que é a ideia de que não é preciso seguir as normas internacionais. No
caso do clima, especificamente, nós temos que reconhecer que é um problema
global, [mas] a responsabilidade é nacional”, diz.
Celso Amorim reconhece que o mandatário da França, Emmanuel
Macron, não é movido apenas por interesses ambientais: há preocupações com
a integridade territorial da Guiana Francesa – um protetorado francês em
território sul-americano. E o caos ambiental no Brasil também serve como
instrumento para colocar o acordo da União Europeia com o Mercosul sob
contestação, para agrado dos agricultores franceses, que temem os possíveis
efeitos da aliança comercial.
Por outro lado, o ex-chanceler ressalta que a França não tem
condições de empreender uma intervenção direta na Amazônia e completa dizendo
que a retórica nacionalista de Bolsonaro tem limites na prática, como pode ser
visto em sua intenção de liberar a mineração na Amazônia para empresas
estrangeiras, especialmente estadunidenses.
Rita Serrano, coordenadora do Comitê Nacional em Defesa das
Empresas Públicas, também irá participar do seminário sobre soberania
popular, e segue pela mesma linha de Amorim, afirmando que o discurso de
Bolsonaro representa muito mais um alinhamento aos EUA – e consequente
contraposição à União Europeia – do que um posicionamento efetivamente
pró-soberania.
“Tudo aquilo que é público – universidades, sistema de saúde, as
empresas estatais, a própria Amazônia – está sob risco. Diante de todo o
processo de desmantelamento do patrimônio público, temo que perguntar quem está
ganhando. São as multinacionais”, sentencia. Ela cita o caso exemplar da BR
Distribuidora, subsidiária da Petrobras que foi vendida para empresas
estrangeiras, entre elas companhias estadunidenses.
Na prática
Na balança entre autonomia nacional e compromissos
internacionais, Celso Amorim defende que cabe a “nós” a resolução da questão da
Amazônia, “dentro das regras” e com possível ajuda internacional: “Quem
define o que fazer deve ser o Brasil”. Ele cita ainda o exemplo do Fundo
Amazônia, que por meio de financiamento internacional implementava
projetos selecionados pelo governo brasileiro.
O deputado federal Edmilson Rodrigues (PSOL-PA), que também deve
comparecer ao seminário, tem entendimento crítico em relação ao posicionamento
francês, por entender que Macron ultrapassou a linha entre ajuda e tentativa de
imposição, o que favoreceu o discurso de Bolsonaro, baseado em um “cinismo
antinacional e antissoberano”.
“Macron, que deu uma contribuição ao povo brasileiro ao dizer
que Bolsonaro é um criminoso ambiental e mentiroso, foi infeliz ao levantar a
tese, que já havia sido levantada por [François] Mitterrand [que foi o
presidente francês de 1981 até 1995], de que é possível pensar o
território amazônico sob controle internacional. Aceitamos solidariedade
nacional, não ingerência”, diz.
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