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04 outubro 2020

Do fundo do Baú do Amora: Testamento - Toquinho e Vinicius de Moraes









Você que só ganha pra juntar
O que é há? Diz pra mim o que que há?
Você vai ver um dia em que fria você vai entrar.
Curse num balaje
Em baixa escuridão
É fogo irmão
É fogo irmão.
(Pois é amigo
Como se dizia antigamente
O buraco é mais em baixo.
E você com todo seu baú
Vai ficar na mais total solidão
E pensando a beça
Que não levou nada que juntou.
Que fossa meu irmão, que fossa.)
Você que não para pra pensar
Que o tempo é curto
E não para de passar
Você vai ver um dia que remorso
Como é bom parar
Ver o sol se pôr ou ver o sol raiar e desligar.
Ver o sol se pôr ou ver o sol raiar e desligar.
(Moça, título, capital de giro, pobre do enês
E tome gravata
Protocolos,
Encomendas,
Caviar,
Champanhe,
E tome gravata
O amor sem paixão
O corpo sem alma
O pensamento sem espírito
E tome gravata
E lá um belo dia com um enfarte
Ou pior ainda
Um psiquiatra)
Você que só faz usufruir
E tem mulher pra usar e pra exibir
Você vai ver um dia
Em que toca você foi bulir
A mulher foi feita pro amor e pro perdão
Cai nessa não.
A mulher foi feita pro amor e pro perdão
Cai nessa não.
(Você por exemplo
Que está aí com a boneca do seu lado
Linda e chiquérrima
Crente que é o ambo senhor do material
E é aí que o distinto está muitíssimo enganado
Mas as vezes ela anda longe
Perdida no mundo livre e confuso
Cheio de canções aventuras e magias
Que você nem sequer toca sua alma
É, as mulheres são muito estranhas
Muito estranhas)
Você que não gosta de gostar
Pra não sofrer não sorrir e não chorar
Você vai ver um dia
Em que fria você vai entrar.
Curse num balaje em baixa escuridão, é fogo irmão, é fogo irmão
Curse num balaje em baixa escuridão, é fogo irmão, é fogo irmão

Compositores: Antonio Pecci Filho / Marcus Vinicius Da Cruz De M. Moraes

29 agosto 2020

O poema nosso de cada dia: Soneto de fidelidade - Vinicius de Moraes


"De tudo ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure."

Vinicius de Moraes nasceu em 19 de outubro de 1913,  faleceu em 09 de julho de 1980 e foi um dos maiores criadores da cultura brasileira. Escritor, letrista, diplomata, dramaturgo, crítico de cinema, o legado deixado pelo “poetinha” é de valor inestimável.
É certo afirmar que a sua produção poética foi bastante voltada para o tema do amor, embora nas suas obras também seja possível encontrar uma meta-escrita ou até mesmo uma escrita engajada, preocupada com os problemas políticos e sociais do mundo.